Não sei ao certo se dá para chamar de silêncio. Sábados, domingos, terças, Dojo, parque, qualquer dia, qualquer lugar que fosse não havia espaço para palavras. Só se dizia o necessário. Se haviam brincadeiras, eram sempre antes ou após o treino.
Não era exatamente um silêncio, mas não haviam palavras. Tudo que tinha ali, eram aqueles sons de pés se deslocando pelo piso de madeira, tocando o chão de terra na corrida do parque, aquele barulho único dos Karate-Gis de lona raspando, as únicas vozes eram dos comandos dos senseis e os nossos kiais. Eram sons do verdadeiro Karate-Do.
Os sons das nossas vozes nunca foram necessários. Nunca nenhuma conversa que não fizesse sentido foi bem vinda em qualquer local que fosse no nosso treinamento. No parque, nas corridas, sempre lembro do som do meu cansaço, da minha respiração ofegante tentando acompanhar as passadas mais largas do meu irmão.
Às vezes as pessoas entedem que não se fala porque não há espaço para isso. Mas se você compreender cada som do seu mundo, neste caso o meu mundo, percebe que falar não é necessário.
Seguindo com a mesma lembrança do post do meu irmão, todos estão fazendo mais e falando menos, inclusive os senseis que neste caso utilizam as vozes à favor dos comandos e instruções do meu mundo.
Então eu me pergunto: Do que vale sua palavra se falar é só o que você faz?
A minha palavra vale o que eu faço, o que nós fazemos.
No parque, correndo com aquele moleton da nike clássico de capuz, anos atrás eu via o meu irmão treinando. Sem palavras.
Fazer, é a única necessidade. Como diz a nike, daquele velho moleton,
Just Do It.
quinta-feira, 31 de março de 2011
Just Do It
segunda-feira, 28 de março de 2011
Fazer
quinta-feira, 24 de março de 2011
Logo adiante
Se eu fechar os meus olhos por alguns segundos, vou lembrar daquele calor típico do verão japonês. Lembrarei de um túnel e uma estrada que sobe rumo às montanhas. O sol brilha de um jeito que só no Japão brilha e se eu for um pouco além destes segundos, posso sentir o cheiro da natureza e ouvir os sons que ela produz com tanta perfeição.
Se eu fizer um minuto de silêncio e fechar os meus olhos, vou lembrar daquele senhor que nos recebu em sua casa de forma tão gentil, por mais que nós fossemos parentes tão distantes vindos de uma terra que ele nunca conheceu. Vou lembrar do que comemos naquele restaurante e vou lembrar do chiclete de menta que vinha acompanhando a refeição para aliviar o nosso hálito pós almoço.
Vou lembrar de jogar uma partida de video game em algum mercadinho local contra o meu primo que tinha ido passear no Japão.
Vou lembrar do quanto brincamos e do quanto era medonha aquela máscara de Oni pendurada na parede do hotel, quando era vista de noite, iluminada apenas pelas luzes das máquinas de refrigerante.
Essas são as minhas lembranças de Fukushima, recordadas em um minuto de silêncio. Por alguns dias, o meu sangue voltou para casa.
Hoje, Fukushima sofre com os problemas trazidos pelo tsunami.
Hoje completo 29 anos de vida. E assim como eu desejo que Fukushima (não só Fukushima, mas todo o Japão) tenha forças para seguir adiante, cada vez mais forte, superando TODAS as dificuldades, eu também desejo para mim o mesmo. Seguir melhor, seguir mais forte, seguir mais intenso, melhor à cada dia.
segunda-feira, 21 de março de 2011
Ganbare Nippon
segunda-feira, 14 de março de 2011
Catástrofe no Japão - Como Ajudar (atualizado 16/03)
Banco do Brasil
Agência 1196-7
Conta corrente 29.921-9
Federação das Associações de Províncias do Japão no Brasil
CNPJ - 46.568.895/0001-66
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E-mail: info@kenren.org.br
Telefones: (11) 3277-8569 / 3277-6108 / 3399-4416
Fax: (11) 3207-5224
Titular : Associação Fukushima Kenjin do Brasil
CNPJ : 62.871.686/0001 - 43
Banco : Banco do Brasil
Agência : 1196 - 7
C/C : 14.382 / 0
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Catástrofe no Japão
quinta-feira, 10 de março de 2011
Sagrados elementos do clima
Uma das coisas que eram bem diferentes no Japão, era a temperatura local. A província de Shizuoka, apresentava estações do ano muito bem definidas (na minha opinião). O mês de agosto é um calor tremendo e o verão é abafado. O inverno não era tão rigoroso como em outras regiões do país, mas comparado com os pseudo-invernos existentes em São Paulo por exemplo, era sim um frio bem considerável.
Neste cenário climático, de uma forma ou de outra os treinos sempre pareciam pegar fogo. O meu primeiro verão no Japão, também foi o meu primeiro verão treinando Karate. Sob aquele mormaço da cidade litorânea de Sagara e entre aquelas paredes e pisos de madeira escura, os kihons nos davam a sensação de estar numa sauna em movimento. O dojo de Sagara possuia uma única pia com uma torneira para se beber água e até hoje quando lembro dos treinos no verão ali, penso que aquela água era sagrada.
Com as estações bem definidas, óbviamente o treino no inverno também não era nada fácil. Tanto que, com excessão dos homens adultos, era permitido usar camiseta por baixo do Karate-Gi nos dias de frio mais intenso.
O piso de madeira, no inverno escorregava muito. Ao contrário do verão, onde o calor era úmido, no inverno o ar era seco e o sensei colocava um aparelho no canto do dojo para umidificar o ar.
Não bastassem as tábuas geladas no chão, nós molhávamos os pés num pano de chão, que apesar de gelar mais ainda os pés, pelo menos nos deixava com os pés muito menos escorregadios, o que de fato era um fator importante para quem quer permanecer em pé. Entre os "prazeres" do inverno no Dojo, ficar sentando em seiza, que já não era gostoso no verão, no inverno, naquela madeira então, definitivamente não era o ápice de diversão do meu dia.
Entre uma sequência de exercícios e outra, entre Kihon, Ido, Kata e Kumite, no inverno aquela única torneira citada já não era mais o nosso atrativo sagrado. Entre os adultos, talvez sim. Mas entre nós, os moleques, sagrados eram aqueles cinco minutos na frente do stove ( ストーブ), aquecedores populares no Japão que geralmente são abastecidos por algum tipo de combustível líquido ou por energia elétrica. Durante os pequenos internavalos, a molecada corria para a frente do stove e ficava ali esfregando as mãos e esquentando a sola dos pés uma à uma com o calor do aquecerdor.
O que não mudava de fato era o ritmo do treino. Sendo com temperaturas próximas à 0ºC ou 30ºC, o treino era sempre o mesmo. Nunca existiu justificativa para ser diferente, seja por calor ou frio. Meu irmão sempre seguiu essa linha e eu, o fiel escudeiro com um verão e um inverno já citados no texto, ia entrando de vez no mesmo clima.
segunda-feira, 7 de março de 2011
Um Dojo Tradicional
quinta-feira, 3 de março de 2011
Enbusen de geladeira
Aos poucos eu ia me adaptando à minha nova realidade. Na verdade, a minha adaptação ao novo país estava sendo muito mais rápida do que se podia imaginar. Na escola já tinha feito amigos (em grande parte graças ao professor, o sensei Oishi que fez de tudo para que eu me adaptasse da melhor maneira com o restante das crianças da sala) e estes já frequentemente vinham me visitar em casa após as aulas. Ser criança possui uma tremenda vantagem em relação à ser adulto: A criança ainda está se moldando, ainda não possui conceitos completamente fixos e a aceitação para as coisas novas do mundo, do ambiente são muito mais facilmente "digeridas" do que um ser humano em fase adulta, onde possui inúmeras barreiras psicológicas dentro da sua cabeça responsável por definir e rotular todas as situações da vida. Ser criança, na evolução do ser como pessoa, inevitavelmente eu classifico como uma fase onde é sempre muito mais fácil de se aprender, se adaptar à alguma coisa ou situação.
Com os amigos japoneses da escola, eu tinha várias atividades à serem exploradas. De pedaladas de bicicleta até o "Circle K" mais próximo para comer um "Niku-man", até os campinhos do bairro para um "Catch ball".
Entre os amigos e a escola que era período quase integral, nesta época em que eu ainda era faixa branca recém iniciado no Karate, estavam lá colados na geladeira os desenhos que o meu irmão fez para mim com o Embusen do Taikyoku Jodan (primeiro Kata da linhagem Yamaguchi Goju-Kai de Karate Goju-Ryu). O desenho era caprichado, não era simplesmente uma indicação de direções do Kata. O desenho tinha detalhadamente os pés desenhados como pegadas, formando exatamente o posicionamento dos pés em sanchin-dachi e zenkutsu-dachi (bases de Karate). Com uma jornada de trabalho tão pesada, eu sinceramente não sei onde meu irmão encontrava tempo e disposição para fazer coisas como essa.
Hoje em dia quando nossos alunos se justificam, seja a "falta de tempo", dor de barriga ou qualquer outra coisa, eu lembro do meu irmão e de como eu aprendi com ele que, o verdadeiro valor das pessoas está em sua sede de tentar. Afinal, Karate-Do é o caminho de uma perfeição que nunca irá existir e tentar é exatamente o que te define ao caminhar por esta estrada.
Se existe alto que eu quis por toda a minha vida dentro do Karate, foi caminhar entre os grandes. Neste caso, significava ser igual ao meu irmão. Nesses quase vinte anos de treino, as lições que eu aprendi perseguindo este objetivo foram muito além do significado óbvio daquele desenho colado na porta da geladeira. Lembrando daquele papel ali, só consigo pensar que você faz de tudo por aquilo que você realmente se importa, mesmo que você trabalhe dezesseis horas por dia numa fábrica. Se você quer ser grande, primeiro tem que tentar com o melhor que você tem.
Naquele papel estava escrito que, ele era sim, o melhor que podia ser.