quinta-feira, 31 de março de 2011

Just Do It

Não sei ao certo se dá para chamar de silêncio. Sábados, domingos, terças, Dojo, parque, qualquer dia, qualquer lugar que fosse não havia espaço para palavras. Só se dizia o necessário. Se haviam brincadeiras, eram sempre antes ou após o treino.
Não era exatamente um silêncio, mas não haviam palavras. Tudo que tinha ali, eram aqueles sons de pés se deslocando pelo piso de madeira, tocando o chão de terra na corrida do parque, aquele barulho único dos Karate-Gis de lona raspando, as únicas vozes eram dos comandos dos senseis e os nossos kiais. Eram sons do verdadeiro Karate-Do.
Os sons das nossas vozes nunca foram necessários. Nunca nenhuma conversa que não fizesse sentido foi bem vinda em qualquer local que fosse no nosso treinamento. No parque, nas corridas, sempre lembro do som do meu cansaço, da minha respiração ofegante tentando acompanhar as passadas mais largas do meu irmão.

Às vezes as pessoas entedem que não se fala porque não há espaço para isso. Mas se você compreender cada som do seu mundo, neste caso o meu mundo, percebe que falar não é necessário.
Seguindo com a mesma lembrança do post do meu irmão, todos estão fazendo mais e falando menos, inclusive os senseis que neste caso utilizam as vozes à favor dos comandos e instruções do meu mundo.
Então eu me pergunto: Do que vale sua palavra se falar é só o que você faz?
A minha palavra vale o que eu faço, o que nós fazemos. 
No parque, correndo com aquele moleton da nike clássico de capuz, anos atrás eu via o meu irmão treinando. Sem palavras.
Fazer, é a única necessidade. Como diz a nike, daquele velho moleton,
Just Do It.

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segunda-feira, 28 de março de 2011

Fazer


Uma das coisas que mais admiro na cultura japonesa, e que aprendemos com nossos pais e com nosso Mestre na prática do karate, é o fato de que o valor de "fazer" é maior do que o valor de "falar". Nossos treinamentos no Honbu Dojo, na cidade de Sagara, eram baseados exatamente neste pensamento, tanto o nosso Mestre Konomoto, quanto o Sensei Nagatani, sempre "mostravam" como fazer e não apenas falavam (e claro, tínhamos que "fazer" repetidas vezes, até ficar aceitável). Isso sempre foi muito importante na nossa base de aprendizado e com certeza, mantemos este mesmo pensamento até hoje.

Nestes treinamentos nosso Sensei sempre nos ensinava que a prática é que nos mantém humildes e que o suor de nossos karate-gis é que nos dá a verdadeira medida de quem somos, sábias palavras.

No honbu Dojo fazíamos periódicamente o "soji" no final das aulas e para a garotada é também um hora de diversão. Passar o pano do chão do Dojo, agachado empurrando o pano, virava uma divertida corrida entre eles. Este Soji servia para limpar não apenas a sujeira, mas também nossas impurezas.

O que fica destas lições é que hoje em dia, muitos falam, da elevação espiritual, do aperfeiçoamento técnico, da busca pela perfeição e da superação, mas o que vale mesmo é o que "fazemos" e o que damos como exemplo.

Grandes lições de todos os dias em que vivemos no Japão, de pessoas que servem realmente de exemplo, lições para a vida toda!!!!!

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quinta-feira, 24 de março de 2011

Logo adiante

Se eu fechar os meus olhos por alguns segundos, vou lembrar daquele calor típico do verão japonês. Lembrarei de um túnel e uma estrada que sobe rumo às montanhas. O sol brilha de um jeito que só no Japão brilha e se eu for um pouco além destes segundos, posso sentir o cheiro da natureza e ouvir os sons que ela produz com tanta perfeição.
Se eu fizer um minuto de silêncio e fechar os meus olhos, vou lembrar daquele senhor que nos recebu em sua casa de forma tão gentil, por mais que nós fossemos parentes tão distantes vindos de uma terra que ele nunca conheceu. Vou lembrar do que comemos naquele restaurante e vou lembrar do chiclete de menta que vinha acompanhando a refeição para aliviar o nosso hálito pós almoço.
Vou lembrar de jogar uma partida de video game em algum mercadinho local contra o meu primo que tinha ido passear no Japão.
Vou lembrar do quanto brincamos e do quanto era medonha aquela máscara de Oni pendurada na parede do hotel, quando era vista de noite, iluminada apenas pelas luzes das máquinas de refrigerante.
Essas são as minhas lembranças de Fukushima, recordadas em um minuto de silêncio. Por alguns dias, o meu sangue voltou para casa.
Hoje, Fukushima sofre com os problemas trazidos pelo tsunami.
Hoje completo 29 anos de vida. E assim como eu desejo que Fukushima (não só Fukushima, mas todo o Japão) tenha forças para seguir adiante, cada vez mais forte, superando TODAS as dificuldades, eu também desejo para mim o mesmo. Seguir melhor, seguir mais forte, seguir mais intenso, melhor à cada dia.

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segunda-feira, 21 de março de 2011

Ganbare Nippon


Em todos os anos em que passamos no Japão, uma das palavras que mais ouvimos era "Ganbare" ou seja "Esforce-se pelo seu melhor", "Persevere, continue". Sempre vindo de pessoas que respeitamos e admiramos de um país onde sempre tem alguma lição a nos dar. Talvez alguns aspectos são estranhos ao povo ocidental, principalmente ao povo brasileiro, que me desculpe, temos o mal hábito de sempre adotarmos uma posição crítica, mesmo às vezes não entendendo do assunto a fundo, nos apoiando no fato de simplesmente acharmos que algo deve ser assim. O fato ocorrido na semana passada, do terremoto seguido de tsunami e agora a crise nuclear, nos traz mais uma vez um ensinamento, um ensinamento de ordem, de disciplina, de auto-controle mediante a uma situação crítica. A imagem das pessoas em fila esperando por comida, água, combustível, sem levar vantagem, sem desordem, sem desespero. Não que elas não estivessem assustadas, com medo, com fome, com frio, muito pelo contrário, não imagino o quanto estas pessoas estivessem abaladas com o ocorrido, mas, nada disso mudou o que se tem por dentro, o que se aprende desde criança na educação. Honestidade, caráter, pensamento no próximo, desapego e falta de egoísmo. Ao invés de criticarmos algo motivado apenas pelo coração, com total falta de raciocínio (como o repórter Marcos Uchoa da rede Globo) que disse que: "Se todo japonês fizesse o que os brasileiros estavam fazendo, não tinha ninguém passando fome...", pelo fato de alguns brasileiros terem feito uma caravana para levar comida até as áreas afetadas. O que "ele" não sabe, é que aquele é um país organizado, e não que o "povo" não pensa no próximo. Talvez motivado por esta reportagem com este cometário "absurdo" alguns brasileiros resolveram também fazer a caravana. Resultado final, tentaram passar por uma área de risco, com muita neve, ficaram perdidos, acabou a gasolina dos carros e tiveram que ser resgatados por uma equipe da polícia, que na verdade deveriam estar atendendo os verdadeiros necessitados. Se não há nada de produtivo no que se vai falar, melhor não falar nada....

Admiro aquele país e aquele povo, não tenho dúvidas de que superarão mais esta provação e se reerguirão de forma rápida e organizada.

Nada mais justo do que desejar àquele povo e àquele país, o que sempre ouvimos deles:

"Ganbare Nippon!!!!!"

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segunda-feira, 14 de março de 2011

Catástrofe no Japão - Como Ajudar (atualizado 16/03)

Para os interessados em ajudar às pessoas afetadas pelo terremoto/tsunami no Japão, é possível ajudar através do Kenren (Federação das Associações das Províncias do Japão). Doações de roupas e alimentos para o Japão podem ser feitas na matriz da Kenren (Federação das Associações das Províncias do Japão) -http://www.kenren.org.br/ - Rua São Joaquim, 381 - 3º andar salas 35/36. 
O Kenren também abriu esta semana a primeira conta brasileira destinada à arrecadar fundos destinados aos afetados pela catástrofe.
Dados da conta:
Banco do Brasil
Agência 1196-7
Conta corrente 29.921-9
Federação das Associações de Províncias do Japão no Brasil
CNPJ - 46.568.895/0001-66

Mais informações:
E-mail: info@kenren.org.br
Telefones: (11) 3277-8569 / 3277-6108 / 3399-4416
Fax: (11) 3207-5224 


Ajude à divulgar estas informações, nós da Shizuoka Goju-Kan do Brasil agradecemos de coração.

*atualizado 16/03
Para ajudar as vítimas da Província de Fukushima, a Associação Fukushima Kenjin do Brasil, abriu uma conta para arrecadar fundos, as doações devem ser de no mínimo 50 reais:

Titular : Associação Fukushima Kenjin do Brasil
CNPJ : 62.871.686/0001 - 43
Banco : Banco do Brasil
Agência : 1196 - 7
C/C : 14.382 / 0


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Catástrofe no Japão


Olá a todos, peço a licença hoje excepicionalmente de não postar a nossa história como de costume, em função da catástrofe acontecida no Japão na última sexta-feira, para postar sobre a história sim dos nossos antepassados e solidarizarmos com o fato.

Como sabem, o Saito Brothers tem sua origem no Japão, mais precisamente na Província de Fukushima. Meus avós maternos são de lá, meu avô paterno também e minha avó paterna é da Província de Miyagi. Quando estivemos no Japão, fomos até Koriyama, na Província de Fukushima, em visita aos primos de minha mãe, um deles que havia vindo ao Brasil como imigrante, mas após alguns anos retornou ao Japão, diferentemente da grande maioria que adotou aqui sua nova nação. É difícil ficar indiferente ao fato de nossas origens, temos lá as nossas raízes, que sem eles, não estaríamos aqui contando a nossa história.

Acredito sem dúvidas que o Japão irá se reerguer, de forma rápida e organizada, pois sei de sua força e garra.

Daqui o que podemos fazer é orar para as vítimas e sobreviventes. Esperar pelas notícias de nossos parentes, amigos e conhecidos que vivem lá, já que ainda não está estabelecida a energia elétrica e telefonia em vários lugares do Japão.

Nossos Senseis de karate (Konomoto Takashi, Nagatani, Takeda) moram na região de Shizuoka, onde o tremor foi de menor magnitude, os Senseis (Yamaguchi, Kakinuki entre outros) moram na região de Tokyo, região bem afetada pelo terremoto, mas Kakinuki Sensei me enviou uma mensagem dizendo que estão bem. Apenas o nosso Soke de Bojutsu (Kanno Tomiie) é que não temos notícia, pois mora em Fukushima e não há contato telefônico.

Durante a semana a Associação Fukushima Kenjinkai do Brasil, abrirá uma conta bancária para arrecadar doações para as vítimas, quando obtiver o número, postarei aqui para que possamos divulgar e ajudar.

Semana que vem voltaremos a postar aqui a história dos Saito Brothers, mas por enquanto o que podemos fazer é enviar o máximo de energia positiva.
Ganbare Nippon !!!!!

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quinta-feira, 10 de março de 2011

Sagrados elementos do clima

Uma das coisas que eram bem diferentes no Japão, era a temperatura local. A província de Shizuoka, apresentava estações do ano muito bem definidas (na minha opinião). O mês de agosto é um calor tremendo e o verão é abafado. O inverno não era tão rigoroso como em outras regiões do país, mas comparado com os pseudo-invernos existentes em São Paulo por exemplo, era sim um frio bem considerável.
Neste cenário climático, de uma forma ou de outra os treinos sempre pareciam pegar fogo. O meu primeiro verão no Japão, também foi o meu primeiro verão treinando Karate. Sob aquele mormaço da cidade litorânea de Sagara e entre aquelas paredes e pisos de madeira escura, os kihons nos davam a sensação de estar numa sauna em movimento. O dojo de Sagara possuia uma única pia com uma torneira para se beber água e até hoje quando lembro dos treinos no verão ali, penso que aquela água era sagrada.

Com as estações bem definidas, óbviamente o treino no inverno também não era nada fácil. Tanto que, com excessão dos homens adultos, era permitido usar camiseta por baixo do Karate-Gi nos dias de frio mais intenso.
O piso de madeira, no inverno escorregava muito. Ao contrário do verão, onde o calor era úmido, no inverno o ar era seco e o sensei colocava um aparelho no canto do dojo para umidificar o ar.
Não bastassem as tábuas geladas no chão, nós molhávamos os pés num pano de chão, que apesar de gelar mais ainda os pés, pelo menos nos deixava com os pés muito menos escorregadios,  o que de fato era um fator importante para quem quer permanecer em pé. Entre os "prazeres" do inverno no Dojo, ficar sentando em seiza, que já não era gostoso no verão, no inverno, naquela madeira então, definitivamente não era o ápice de diversão do meu dia.

Entre uma sequência de exercícios e outra, entre Kihon, Ido, Kata e Kumite, no inverno aquela única torneira citada já não era mais o nosso atrativo sagrado. Entre os adultos, talvez sim. Mas entre nós, os moleques, sagrados eram aqueles cinco minutos na frente do stove ( ストーブ), aquecedores populares no Japão que geralmente são abastecidos por algum tipo de combustível líquido ou por energia elétrica. Durante os pequenos internavalos, a molecada corria para a frente do stove e ficava ali esfregando as mãos e esquentando a sola dos pés uma à uma com o calor do aquecerdor.

O que não mudava de fato era o ritmo do treino. Sendo com temperaturas próximas à 0ºC ou 30ºC, o treino era sempre o mesmo. Nunca existiu justificativa para ser diferente, seja por calor ou frio. Meu irmão sempre seguiu essa linha e eu, o fiel escudeiro com um verão e um inverno já citados no texto, ia entrando de vez no mesmo clima. 

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segunda-feira, 7 de março de 2011

Um Dojo Tradicional

Quando chegava o sábado, lá íamos nós para o treino no Honbu Dojo de Shizuoka. O treino era sempre conduzido com muita disciplina e rigor. Era muito legal ver meu irmão caçula, ali junto aos outros garotos de sua idade, se esforçando para aprender os ensinamentos passados pelo Nagatani Sensei. O choque cultural é grande, e acredito que a grande lição de quem vive um tempo no exterior, é conseguir entender e agregar o que as culturas trazem de bom. Conosco não foi diferente. Enquanto Nagatani Sensei, explicava determinada técnica, os alunos, crianças e adultos, se sentavam de joelhos (seiza) e em completo silêncio prestavam atenção às instruções. Para quem não tem em seus costumes, o hábito de se sentar de joelhos, é uma situação de grande sofrimento e de desconforto. Mas não estávamos ali para darmos nossas justificativas, estávamos ali para aprender e quando se quer algo de verdade, de coração, qualquer sacrifíco é pouco. Para mim, aquele sofrimento já não era tanto, pois meu corpo já estava se acostumando, afinal, já estava ali a dois anos. Mas me lembrava das minhas primeiras aulas, em que tive que ficar naquela posição e quando o Sensei chamava meu nome para fazer algum movimento ou kata, precisava me escorar na parede e ficar ali por um tempo se me mover, pois as pernas se encontravam totalmente adormecidas. Me lembrava disso e imaginava que o Horácio talvez estivesse passando pela mesma situação. Mas ali era um Dojo tradicional e não tinha tratamento especial para ninguém, nem para um estrangeiro de dez anos. Era exigido dele, o que era exigido dos outros garotos de sua idade.
Um Dojo Tradicional, que molda pessoas campeãs, vencedoras, não apenas de competições, mas da vida.

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quinta-feira, 3 de março de 2011

Enbusen de geladeira

Aos poucos eu ia me adaptando à minha nova realidade. Na verdade, a minha adaptação ao novo país estava sendo muito mais rápida do que se podia imaginar. Na escola já tinha feito amigos (em grande parte graças ao professor, o sensei Oishi que fez de tudo para que eu me adaptasse da melhor maneira com o restante das crianças da sala) e estes já frequentemente vinham me visitar em casa após as aulas. Ser criança possui uma tremenda vantagem em relação à ser adulto: A criança ainda está se moldando, ainda não possui conceitos completamente fixos e a aceitação para as coisas novas do mundo, do ambiente são muito mais facilmente "digeridas" do que um ser humano em fase adulta, onde possui inúmeras barreiras psicológicas dentro da sua cabeça responsável por definir e rotular todas as situações da vida. Ser criança, na evolução do ser como pessoa, inevitavelmente eu classifico como uma fase onde é sempre muito mais fácil de se aprender, se adaptar à alguma coisa ou situação.
Com os amigos japoneses da escola, eu tinha várias atividades à serem exploradas. De pedaladas de bicicleta até o "Circle K" mais próximo para comer um "Niku-man", até os campinhos do bairro para um "Catch ball".

Entre os amigos e a escola que era período quase integral, nesta época em que eu ainda era faixa branca recém iniciado no Karate, estavam lá colados na geladeira os desenhos que o meu irmão fez para mim com o Embusen do Taikyoku Jodan (primeiro Kata da linhagem Yamaguchi Goju-Kai de Karate Goju-Ryu). O desenho era caprichado, não era simplesmente uma indicação de direções do Kata. O desenho tinha detalhadamente os pés desenhados como pegadas, formando exatamente o posicionamento dos pés em sanchin-dachi e zenkutsu-dachi (bases de Karate). Com uma jornada de trabalho tão pesada, eu sinceramente não sei onde meu irmão encontrava tempo e disposição para fazer coisas como essa.

Hoje em dia quando nossos alunos se justificam, seja a "falta de tempo", dor de barriga ou qualquer outra coisa, eu lembro do meu irmão e de como eu aprendi com ele que, o verdadeiro valor das pessoas está em sua sede de tentar. Afinal, Karate-Do é o caminho de uma perfeição que nunca irá existir e tentar é exatamente o que te define ao caminhar por esta estrada.

Se existe alto que eu quis por toda a minha vida dentro do Karate, foi caminhar entre os grandes. Neste caso, significava ser igual ao meu irmão. Nesses quase vinte anos de treino, as lições que eu aprendi perseguindo este objetivo foram muito além do significado óbvio daquele desenho colado na porta da geladeira. Lembrando daquele papel ali, só consigo pensar que você faz de tudo por aquilo que você realmente se importa, mesmo que você trabalhe dezesseis horas por dia numa fábrica. Se você quer ser grande, primeiro tem que tentar com o melhor que você tem.

Naquele papel estava escrito que, ele era sim, o melhor que podia ser.

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