segunda-feira, 30 de maio de 2011

Pocari Sweat

Uma das coisas legais de se viver no Japão, é que não importa para onde você vá, seja para o litoral, para o "Inaka" (área rural afastada dos grandes centros), qualquer cidade de qualquer Província, para plantações de arroz, de chá, de frutas, verduras ou legumes, para passeios em Templos, na natureza, trilhas nas montanhas, enfim, para qualquer lugar mesmo, você sempre encontrará uma máquinha de venda de refrigerante. Claro que não se vendia apenas refrigerantes, mas também sucos (com sabores dos mais variados), cafés (quente e gelado), chás, chocolates e o Santo isotônico Pocari Sweat. E esta era a nossa bebida de bate-papo. Sempre após treinarmos no Shie Gurando, voltávamos andando e logo em frente havia uma destas máquinas. Nessas horas tinha aquela sensação boa de dever cumprido. Pegar a latinha de Pocari Sweat ou a garrafinha de vidro (500ml) e literalmente "virar" num gole de total satisfação. Estes momentos tem significado muito importante para mim, não só pelo fato de nunca desistir de treinar e melhorar, mas pelo fato de poder conversar com meu irmão caçula, Horácio. A conversa se iniciava sempre pelo que havíamos feito no treino, às vezes um elogio, outras uma palavra de incentivo, ou uma correção. Mas não se limitava apenas aos treinos. Posso dizer que nossa proximidade e a confiança da amizade, nasceu destas conversas. O Karate nos uniu não apenas dentro do Dojo, mas na vida, de forma geral.
Lembro-me de uma destas conversas, onde explicava como respirar de forma correta para amenizar a famosa dor no "baço" que sempre atrapalha após algum tempo correndo. Quando ouvimos que o Budo é feito da verdade de cada um, acredito nesta verdade. Nesta conversa explicava que o controle da velocidade entre inspirar e expirar, ajudaria a aumentar a quantidade de oxigênio, que deveria inspirar pelo nariz e expirar pela boca. E entre um gole e outro do nosso Pocari, íamos andando de volta ao nosso apartamento. Estas eram as nossas verdades, caminhando após um bom treino, cansados, doloridos, conversando. Verdades vivas até hoje, quando conversamos e comentamos de nossas corridas e treinos atuais, as distâncias aumentaram, a performance melhorou, mas as dores ainda existem e o cansaço também, frutos de nossas verdades na hora da execução. Falta apenas a máquina de refrigerante na volta para casa e o nosso Pocari Sweat para "matar" a sede......

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quinta-feira, 26 de maio de 2011

It's all about Kokoro

A língua japonesa, se não for a única, é uma das poucas que tem duas palavras distintas para definir o que generealizamos como coração. Uma delas, a palavra Kokoro (心), se refere ao lado emocional e espiritual deste coração.
A volta para casa, a ida para o Dojo ou o caminho a pé rumo aos treinos físicos no parque. Talvez, estes tenham sido os momentos em que eu mais pude aprender sobre o significado e a importância da palavra "Kokoro" dentro do Karate-Do.
Às vezes eram momentos de silêncio e tensão com uma atmosfera densa e pesada, por outras vezes era tydo descontraído e cheio de conversas que pouco tinham ligação com o Karate, mas sempre, em todas as situações de forma indireta ou direta o Karate-Do esteve presente(afinal, sempre era a ida ou a volta de algum lugar que envolvia a palavra treino).

Voltando do parque Shie Gurando, meu irmão mostra suas mãos, bem machucadas após os socos dados nas árvores do parque ao final do treino. As minhas mãos na maioria das vezes ficavam bem menos machucadas que as dele. Enquanto caminhávamos voltando para casa, numa conversa descontraída comparávamos as nossas mãos e meu irmão se orgulhava das suas, visivelmente orgulhoso por sempre fazer o seu melhor. Ali, me ensinava que a intensidade tinha de ser sempre constante e que se era difícil para mim, era para ele também. Vou aprendendo então, a importância de sempre ter as minhas verdades em jogo.

Socar árvores ou o que quer fosse, não era sobre um calejamento externo. Era sobre se questionar constantemente. Quem você é e quem você quer ser, onde mora sua força ou fraqueza de espírito. Mais tarde, entende-se que qualquer treino que seja, só é treino mesmo, se serve para esse constante questionamento. Tomamos um isotônico (Pocari Sweat, muito popular no Japão) de maquininha e vez ou outra recebo um elogio, uma palavra de reconhecimento pelas minhas mãos, por ter ido mais longe do que o treino passado. Eu sorria e com muito orgulho, limpava o sangue da minha mão.

Dentro do trem, indo para o Dojo. Eu já sabia que teria algum obstáculo, pois meu irmão nunca me deixou treinar na zona de conforto, sempre era incômodo, seja pelo fato de ter que enfrentá-lo na hora extra de treino ou por conta de algum garoto do dojo com quem eu tinha certeza que meu irmão me faria lutar. Como eu nunca foi o melhor, sempre tinha alguém maior, mais forte ou melhor em algum quesito para tornar minhas noites mais "agradáveis". Então dentro do trem, eu sempre vivia  o meu conflito particular, esperando pelo que viria algumas horas depois.

Voltando para casa, na estação de trem. Depois de matar ou morrer. Quando tinha sucesso, estava sorridente contando detalhes para o meu irmão de como eu tinha conseguido me impor diante dos garotos melhores do que eu. Quando não tinha sucesso, estava ali, calado e cabisbaixo, geralmente nervoso, engolindo o choro entre soluços contidos, pensando no que havia feito de errado.  O silêncio neste caso, ensina muito mais do que palavras e meu irmão, sabia disso. Por mais bravo e descontente que ele também estivesse, geralmente ficava calado e também emburrado, porque certamente para ele também não era nada bom saber que eu tinha falhado.

O Caminho, tem os seus caminhos. Dojo, significa literalmente, "o lugar do caminho". Onde você coloca em prática o Karate-Do. Mas as máquinas de refrigerante, o parque, as estações de trem, os trens, me ensinaram que o verdadeiro dojo se chama Kokoro. Porque é ali, que tudo nasce, vive, cresce, evolui e se torna muito maior do que tudo através do tempo, do suor, da dor ou até mesmo do sangue.

Não é sobre seiken, maegeri, kata, kumite ou kihon. Somos o que somos aqui nestas linhas escritas, só porque:

It's all about Kokoro.

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segunda-feira, 23 de maio de 2011

Ser o Caminho

Nossos dias no Japão eram sempre cercados de atividades. Todos os anos em que passei lá na presença de minha família, posso dizer com total certeza, que não houve um único dia em que não tínhamos algo para fazermos juntos, eu e meu irmão caçula Horácio. Uma das coisas da qual me orgulho, é o fato de que pude participar ativimente para que ele pegasse gosto pelo "Caminho". A prática de qualquer arte marcial japonesa envolve todo o fator de conhecimento dos conceitos de guerra, da autodefesa e da cultura do físico. Mas, o que a torna realmente válida para a sociedade é o fato de sua filosofia, da sua preocupação com o melhoramento e o aperfeiçoamento do ser humano.
Neste contexto, a prática do "Caminho" se torna essencial.
- Quando iniciamos a caminhada, temos que nos focar em permanecer no caminho, pois nele sempre haverá obstáculos e imprevistos. A dificuldade é continuar, não desistir, independemente de qual seja a justificativa, a permanência no caminho é que lhe mostrará sua importância.
- Depois, a caminhada passa a ter o caráter de atenção, caminhar e também se concentrar no caminho. Atenção aos detalhes, já que neste estágio, não basta apenas chegar, mas saber por onde caminhou.
- Após muitos anos no caminho, os obstáculos já parecem familiares e já não são suficientes para nos desmotivar e nos fazer desistir, caminhar já não é dificuldade, e os detalhes são sempre notados. Mas o final do caminho ainda parece estar longe e o objetivo parece ser inatingível. É aí que devemos deixar de ser aquele que caminha para passar a "ser" o Caminho.
E todos aqueles dias em que eu buscava trilhar o caminho, indiretamente mostrava ao Horácio a importância daquilo tudo. Claro que, tudo da forma tradicional japonesa, sem explicações, sem desculpas, apenas fazer o que tinha que ser feito. Lembro dos nossos vários caminhos percorridos no tempo em que vivemos no Japão. Os caminhos de corrida em volta do campo, os caminhos de trem e ônibus até chegarmos no Dojo, os caminhos de diversão nos "Game Centers" para jogar Street Fighter, os caminhos de táxi, a pé e de trem para ir dar treino. Muitos eram os caminhos que percorríamos juntos naquela época, mas, ao olhar para trás, me orgulho de ver que todo o esforço que nos fez chegar até aqui, hoje, nos fez mais do que apenas chegar, nos fez "sermos" o Caminho......

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quinta-feira, 19 de maio de 2011

A arena de inverno

Está frio, saio correndo de manhã, antes do trânsito ficar caótico na cidade. As mãos estão geladas, ao final da corrida, a pele do rosto arde ressecada pelo vento gelado e literalmente sai fumaça(vapor) do meu corpo. Ah, como eu gosto dessa sensação.
Caminhando de volta para casa, fumaçando e ofegante passo pelas pessoas que me olham de forma meio estranha, com certo ar de espanto. Eu ignoro os olhares e mergulho na razão de estar ali, sozinho, voltando para casa exausto entre aqueles olhares curiosos:
"O vento quase não sopra no inverno daquele lugar. A iluminação do campo era suficiente para fazer daquele treino "O" evento do dia. Naquele dia, não tinha treino de Karate no Dojo e o meu irmão trabalhava no período diurno, sendo assim, essa hora vaga do dia era o nosso espaço para "fazer acontecer".

Treinávamos ali. Corríamos ou melhor, meu irmão corria e eu sofria. Quantas vezes acabei sendo um atraso para o treinamento do meu irmão, hoje em dia eu sorrio de canto de boca quando lembro dessas cenas. A "dor no baço" era terrível e sempre vinha seguida da "dor no ombro". Tinha vontade de parar, de andar, mas sempre meu irmão reduzia a marcha e ao meu lado corria e dizia "só mais uma volta, só mais um pouco". Aos trancos e solavancos, sempre dava para terminar o treino.

Após a corrida, vinham os Kihons, os Katas, a movimentação de Shiai Kumite e por último, as flexões de mãos fechadas em cima das pedras e os socos nas árvores que cercavam o campo.

As flexões deixavam sempre a pele afundada, com a marca das pedras nos dedos. Quem tinha mais marcas prfundas era o vencedor moral daquele exercício, assim como quem arrancasse mais "casca" das árvores com socos era o vencedor da segunda etapa."

Caminhando de volta para casa, voltando do treino. Exatamente onde eu deveria estar. No frio, com a pele ressecada e ardendo. Ali, não é só sobre ganhar, perder, ser melhor técnicamente ou fisicamente.
Físico você lapida, técnica você aprende, você ensina. Mas um ideal, você assume.
Treinar Karate-Do, é correr, é lutar e acima tudo, é conflitar suas verdades de ontem com as de hoje dizendo para si mesmo, quem você quer ser amanhã.

Voltando da corrida abrindo o portão de casa, eu sempre tenho as minhas respostas.

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segunda-feira, 16 de maio de 2011

Treinar e aprimorar


Nosso treinamento sempre esteve voltado para o aprendizado do Karate-do, independentemente de estarmos competindo ou não. Passados os meses de competição, que precisávamos treinar alguns aspectos específicos das regras da competição, agora voltávamos ao nosso velho e bom treino diário tradicional. Nossos Senseis se empenhavam em ensinar as virtudes da arte que praticávamos, a humildade, simplicidade, respeito, perseverança, honra e o discernimento entre o certo e o errado. E um dos conceitos passados nestes treinos era o fato de que todos precisamos de motivação para chegar a algum lugar, mas o mais importante, era o aperfeiçoamento daquilo que já havia alcançado.
O treinamento do karate-do, se visto de forma quantitativa, com o tempo, inevitavelmente se tornará monótono. Mas, se visto da forma correta, que é a qualitativa, se perceberá que a cada fase, o mesmo treinamento deve ser aprimorado, sempre. Nunca abandonamos uma técnica, a mesma técnica aprendida no início do treinamento, quando ainda somos "faixas brancas" é treinada e devidamente aperfeiçoada com o passar do tempo, sempre buscando a perfeição.
O verdadeiro treinamento se faz para vencermos a nós mesmos, nossas fraquezas, nossas imperfeições. Uma delas é o fato de desistirmos e sempre dar uma desculpa para justificar esta fraqueza. Outra é se convencer de que o treinamento intenso do karate-do é feito apenas para os jovens que estejam em plena condição física e ter sempre a desculpa de que se já está ficando velho. Por isso, sigo os exemplos dos nossos Senseis que exemplificam de forma séria e conceituosa que o treinamento intenso do karate-do se faz até o nossá última respiração.
Ali naquele Dojo, o suor, seja de crianças, como o do Horácio e de muitas outras que estavam ali seriamente como verdadeiros guerreiros, de jovens, de adultos como eu ou de alunos mais velhos, mas sem distinção nenhuma, cada gota valia e tinha o seu devido valor.
O único pensamento era e acredito que sempre será é de "Treinar e aprimorar sempre....."

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quarta-feira, 11 de maio de 2011

Meu irmão

Suado eram os treinos. Mas mais ainda eram os "extras" que vinham após os treinos do dojo. Após o horário convencional das aulas de Karate, meu irmão sempre me pegava para treinar, eu, ele e um relógio que andava lentamente quando dava-se início à essas horas extras.No começo, eram apenas treinos visando o meu aprendizado. Mas com o tempo, comigo ganhando tempo de treino e experiência, o aprendizado entrava cada vez mais em uma etapa onde aprender era um significado mais moral do que prático, porque na prática, eram horas extras que visavam só uma uma coisa, a melhora. Na prática nessas situações, você só vai saber o que aprendeu de verdade tempos depois com aquele trecho já percorrido.
Se no horário de aula, os sons daquele mundo ecoavam, ali no "mano à mano" com o meu irmão eu tinha a sensação de que o silêncio combinando com o som dos golpes, dos Kiais, do Karate-gi de lona estalando, mentalmente me engoliam como um cordeiro. A presença de treino no "mano à mano" era muito diferente e o meu mundo nesse caso sempre se tornava um terreno tenebroso para mim, como se fosse mais o meu mundo e sim o do meu irmão.
A minha "moleza" acabou exatamente quando eu saí da faixa branca. Dali em diante tudo, exatamente tudo até hoje, foi feito com estas horas extras que amigavelmente chamo de bônus game.

Algumas vezes eram repetições de movimentos de Kata infinitas vezes, outras eram direcionadas para as falhas no Shiai Kumite(luta) e em algumas ocasiões era um um "leve" alongamento.
A cobrança crescia à cada dia e nem sempre eu aceitei isso numa boa, tranquilo. Principalmente porque os Saito são cabeças duras por natureza. Era penoso encarar meu irmão com seus vinte e poucos anos enquanto meus amigos de escola estavam em casa assistindo Dragon Ball Z na TV.
Por que eu tinha de ser bom naquilo? Eu nunca ouvi uma palavra se quer sobre isso naquela época. Nunca perguntei, da mesma forma que nunca fui cobrado verbalmente por tal coisa. A palavra vinda de cima para baixo era sempre a mesma: Faça.

Dentro desta arte marcial, as palavras estão sempre em segundo plano.
Muitas pessoas mundo afora se apegam ao sacrficio de forma errada, tornando a dificuldade e o esforço, apenas em palavras soltas sem sentido, apenas para se gabar de algo ou se desculpar por eventual fracasso premeditado.

Nenhum sacrifício do mundo vale um centavo se quer, se falar está antes do fazer. Nenhuma palavra substiturá o trabalho árduo, correto. Eu disse nenhuma. Dentro de uma arte marcial onde o intuíto é criar guerreiros, sacrifício só significa mais glória na vitória e desde que isso sirva só para você mesmo como prova de que você é capaz. Nenhum guerreiro quer pena, nenhum guerreiro faz as coisas premeditando à pena dos outros em relação à ele mesmo. De onde vim, não era sobre matar leões todos os dias e sim aprender como me tornar um deles.

Então, por que eu tinha que treinar tanto, horas à mais que os outros meninos da minha idade? Eu nunca ouvi da boca do meu irmão, mas não era preciso. Eu tinha quer ser melhor para ser o melhor. Para meu irmão apontar o dedo com orgulho e dizer: Aquele, é meu irmão.

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segunda-feira, 9 de maio de 2011

Quando competir é mais que vencer

Em uma competição, existe o Vencedor e o Perdedor, sempre, sem objeção. E se tratando de karate, no país que o criou, a disputa é infinitamente mais acirrada. E, em todo o tempo que vivi no Japão, confesso que perdi muito mais vezes do que venci. Mas penso que meu fortalecimento veio exatamente da idéia de que, podemos sim perder uma batalha, mas nunca desistir e fracassar em vencer a guerra. Sempre treinava e pensava em vencer, mas quando perdia, fazia disso minha lição, aproveitava minha decepção e frustração em perder, para rever muitas e muitas vezes minha luta ou kata para consertar o que tinha feito de errado. A competição acontece em um dia, mas sua preparação técnica, física ou mental, deve ocupar os outros trezentos e sessenta e quatro. Me orguho de ter aprendido a lição de que todas as nossas perdas são frutos de nossas próprias deficiências, sem desculpas ou culpa de terceiros. Se há alguém culpado pela sua perda é você mesmo, aceite, corrija e não desconte nas outras pessoas.
Nas primeiras competições em que participei no Japão, sempre me via como um aprendiz, talvez até respeitasse demais meus adversários, mas, vencer era uma vontade, agora, aprender de verdade, isto sim era o que eu buscava. Nas ocasições em que venci, tinha a sensação de dever cumprido, de ter conseguido sanar os erros anteriores, e isso trazia uma boa vibração. A competição nos traz algumas experiências únicas, que se forem trabalhadas da forma correta, ajudam no processo de desenvolvimento do ser humano.
Competir no Japão é algo que deixa qualquer um sem palavras. A organização, ao ponto de se saber a que horas e até os minutos em que você irá participar. Todas as quadras de competição pré-estabelecidas com suas categorias e atletas, todos devidamente relacionados em um programa que você recebe na entrada do Ginásio. Tudo perfeito. E, claro, uma educação impecável. Nenhum papel ou qualquer outro tipo de sujeira dentro ou fora do Ginásio, nenhuma palavra de baixo calão dirigida a qualquer um que fosse. Árbitros e mesários atentos e executando com explendor suas funções. A única palavra que consigo relacionar a tudo isso, quando me lembro destes campeonatos é "Perfeito".
Vencer é importante, mas competir, vencer e vivenciar tudo isso, acredito ter sido muito mais.....

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quinta-feira, 5 de maio de 2011

O importante é competir - parte II -

Vários meninos da minha idade sentados em volta de um Koto demarcado por fitas no chão. A categoria, só de meninos faixas brancas tinha por volta de vinte e cinco "moleques". Todos ali, uns mais outros menos, mas todos sem excessão estávamos ansiosos com a primeira apresentação à ser realizada em uma competição.
Ali, naquele momento começava oficialmente a minha jornada pelas competições de Karate. Enquanto estava sentado ali, observando os outros garotos se apresentando e aguardando a minha vez, na minha cabeça eu repassava o que tinha de ser feito.
Ver os garotos que se apresentavam antes me ajudava também neste processo, já que a entrada, os "protocolos" padrões eram universais e olhar os que faziam antes da minha vez, me ajudava de forma direta na minha tarefa mental.

O Protocolo consistia basicamente em: Cumprimentar antes de entrar no Koto(na linha de entrada da área de competição), puxar ambos os braços com os punhos cerrados na alturado Hikite(altura da puxada de mão padrão do golpe de Karate, na parte lateral superior da costela), dar uma corridinha até a linha que demarcava onde o atleta tinha de se posicionar para a execução do Kata, cumprimentar novamente e ali, levantar o braço direito em riste anunciando o nome do Kata de forma clara e firme.
No Japão, as crianças utilizavam este padrão de entrada.

Enquanto eu esperava e relembrava os movimentos do Kata, meu irmão estava ali, o mais próximo possível. Observando tudo atentamente. De alguma forma me transimitindo confiança, segurança e apoio. Coisa que até hoje tenho muito orgulho em dizer que ele faz, mesmo após tantos anos. Em seu último campeonato competindo Kata, nos enfrentamos e eu pude vencer este sujeito(isso já é outra história e das boas), que ali, há quase vinte anos atrás e por todos este anos esteve sempre do meu lado. Independentemente da situação, da minha condição, sendo em dias de favoritismo ou em dias de pura descrença por parte dos outros. Se existe uma pessoa que eu posso dizer que sempre acreditou no meu melhor, essa pessoa é aquele cara que ali estava desde o começo, acreditando que eu sempre podia vencer.

Taikyoku Jodan! Anunciva então a versão mirim daquela época. Dezenove movimentos mais tarde, eu estava feliz por ter feito parte daquilo. Da competição em si? Sim, de certa forma. Mas por ser o melhor que eu podia. Dentro do que me cabia, sem modéstia eu posso dizer que foi perfeito. Porém é claro que em campeonato, o seu perfeito compete com o perfeito de outros.

Essa não é uma história de meninos prodígios que ganharam o mundo logo na primeira vez. É a história de dois irmãos que continuam sonhando como naquele dia. Fazer o melhor. O importante ali era competir de fato por conta da primeira experiência. Porém dali em diante, competir era vencer sempre. Os adversários nem sempre, mas a versão anterior de quem você foi no dia de ontem. Você é a competição.
Não fui campeão no meu primeiro campeonato. Mas tinha um sorriso que ia de orelha à orelha. Na verdade, dois sorrisos, um meu, outro do meu irmão orgulhoso.

Se você me perguntasse ali, para onde eu estava indo, certamente eu não saberia responder. Agora eu respondo e entendam, aqueles que falam a mesma língua que nós. Naquele dia, eu, estava indo para casa.

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segunda-feira, 2 de maio de 2011

Shizuoka Ken Goju-kai Taikai


O meu primeiro campeonato no Japão foi em 1991, campeonato da Província de Shizuoka e além do eventual nervosismo, ainda tinha o fator de ser o único brasileiro.
Agora passado um ano, já havia participado do Nacional em Tokyo, já era Shodan e já estava até ajudando os mais novos do Dojo. O pensamento não era mais tanto em mim mesmo, e isso também me ajudava a enfrentar melhor o habitual nervosismo de campeonato. O campeoanto acontecia todos os anos no Ginásio P & G da cidade de Sagara e apesar de não ser seletivo para o campeoanto nacional da Goju-kai, todos os Dojos da Província participavam. As categorias adulto masculino e feminino eram praticamente os mesmos competidores todos os anos, geralmente Senseis e Senpais de seus Dojos. As categorias que realmente eram cheias eram as das crianças, no caso a categoria do Horácio. Primeiro campeonato dele, o início de uma trajetória de vitórias.
Apesar de no Dojo o treinamento ser tradicional e a ênfase na competição em si não ser prioridade, nos nossos treinos diários a competição servia como um estímulo a mais. Vencer, na família Saito sempre foi obrigação, cobrança feita pelo meu pai em tudo que eu fazia e claro, a cobrança agora eu repassava para o Horácio. Muitos acreditam que esta cobrança feita a uma criança pode ser prejudicial, mas eu vejo que toda cobrança feita pelo meu pai só me trouxe benefícios. E, claro, não era cobrado o fato de "ganhar" e sim o de "vencer", que são conceitos bem diferentes. Vencer a si mesmo, vencer suas fraquezas, assumir a responsabilidade pela derrota e buscar corrigi-las ao invés de culpar outros fatores ou pessoas.
"Vencer" agora estava nas mãos do Horácio, vencer seus medos, o nervosismo, a ansiedade, vencer o inimigo imaginável que assombra a todos, nós mesmos.
No campeonato, ele era não apenas um aluno, agora ele tinha a responsabilidade, ele era um Saito, e ele sabia disso.....


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